Inserção externa, exportações e crescimento no Brasil
Nos textos iniciais da CEPAL, e, em particular, no pensamento original de Raul Prebisch, o crescimento das exportações era considerado fator estratégico para um crescimento econômico sustentado. A questão geral com a qual os países latino-americanos se deparavam em seu processo de industrialização, argumentava Prebisch, era a da restrição de divisas; a questão particular com a qual alguns países se deparavam era a exiguidade de seus mercados internos. Contemporaneamente, em diversas teorias e interpretações sobre o desempenho econômico comparativo dos países, a relação entre exportações e crescimento econômico longe de apresentar a mesma clareza como a desenvolvida por Prebisch constitui um tema extremamente polêmico e não raro apresenta- se de forma obscura. A polarização entre uma modalidade de “crescimento liderado pelas exportações” e um “crescimento liderado pelo mercado interno” ou, como assim se refere o Banco Mundial, a existência de uma via “orientada para fora” e uma outra “orientada para dentro” tal como as que supostamente teriam predominado na Ásia e na América Latina revelam interpretações e mecanismos de causalidade muito distintos e mesmo opostos. A rigor, a versão neoclássica do crescimento liderado pelas exportações, difundido pelo Banco Mundial, enfatiza não propriamente o papel das exportações no crescimento mas a importância da neutralidade de incentivos (tarifas, taxa real de câmbio,etc) e da abertura externa (importações) para uma alocação eficiente de recursos. Segue-se desta abordagem um corolário inteiramente arbitrário: as vias de crescimento lideradas pelas exportações foram construídas por políticas econômicas “amigáveis aos mercados” o contrário do que teria predominado naquelas lideradas pelo mercado interno.
Em outro plano, abordagens keynesianas (como as de Mc Combie e Thirwall(1994)) generalizam para todos países o caso particular de algumas economias em que as exportações constituem o principal componente autônomo da demanda. Neste sentido, as diferenças estruturais entre os países são eliminadas. Num outro extremo, outras visões baseiam-se nos casos particulares em que o papel das exportações é restrito enquanto componente de demanda. Um crescimento liderado pelas exportações é uma exceção e em geral é associado negativamente a “plataformas de exportação” típicas de pequenas economias dependentes e complementares ao capital estrangeiro. Nesta abordagem, as exportações são na maioria das economias um resíduo decorrente da expansão interna. Neste caso, o papel das exportações no deslocamento da restrição de divisas é claramente subestimado.
Como aqui pretende-se argumentar, numa direção muito próxima às formulações originais de Prebisch, as exportações podem ser mais ou menos importante para a expansão da economia – de acordo com uma série de características estruturais de cada país- entretanto, seu papel no financiamento e relaxamento da restrição externa ao crescimento é absolutamente central e estratégico para todos os países, com a exceção daquele que emite a moeda de circulação internacional (ver Medeiros e Serrano (1999)).
Neste sentido, é importante distinguir o papel da taxa de crescimento das exportações como componente da tendência da demanda efetiva à longo prazo e a sua função no equacionamento do financiamento externo do desenvolvimento econômico. Dado este objetivo, pretende-se examinar como algumas teorias que privilegiam a questão da demanda efetiva à longo prazo e /ou a restrição externa ao crescimento tratam do papel do crescimento das exportações. Ao mesmo tempo a análise terá como referência primordial a experiência histórica brasileira , não apenas por seu interesse intrínseco, mas também por algumas características peculiares desta experiência que a tornam um desafio para a uma análise como a proposta neste trabalho.
A importância do caso brasileiro reside, em primeiro lugar, não apenas pelo fato de que durante um dos períodos em que a economia apresentou elevadas taxas de crescimento as exportações estagnaram (50-60) como também pela constatação de que num dos períodos de relativamente rápida expansão das exportações (década de 80) a taxa de crescimento da economia foi muito baixa.
A reconsideração do papel central do crescimento das exportações permitirá lidar , ao final do artigo, com o aparente paradoxo de que, na década de 80, a economia brasileira esteve sujeita a uma severa restrição de balança de pagamentos, devido em grande parte ao corte e parcial reversão dos fluxos de capital externo enquanto que na ultima década a economia recebeu enormes fluxos de capital (cuja qualidade tem melhorado mais recentemente ) e, no entanto, apresentou uma performance de crescimento ainda inferior à dos anos 80.
O argumento será apresentado da seguinte forma. Na seção II retomamos a temática estruturalista original sobre a restrição externa ao crescimento dos países periféricos e em particular o processo de substituição de importações. Em seguida, (seção III) será discutido o papel das exportações enquanto componente da demanda efetiva e o que nos permitirá examinar tanto o conceito de crescimento liderado pelas exportações, quanto o de crescimento liderado pela expansão do mercado interno. Uma análise distinguindo as condições de sustentabilidade e as de liquidez externa de uma economia que cresce incorrendo em déficit em conta corrente é apresentada a seguir (seção IV). De posse dos conceitos e indicadores desenvolvidos anteriormente a experiência brasileira será reconsiderada tanto em termos históricos quanto comparativos (seção V), por fim, algumas breves observações conclusivas serão apresentadas (seção VI).
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